Sagrado Coração de Jesus
“FONTE DE MISERICÓRDIA, QUE JORRA DO TEMPLO…” – SOLENIDADE DO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS (ANO B)
“Com alegria bebereis do manancial da salvação.”
(Isaías 12)
Só quem já sentiu sede de verdade sabe o alívio que se sente quando o frescor da água encontra os lábios rachados como a terra seca. São como segundos de eternidade, como se aquele líquido cristalino nos fizesse sentir a experiência do céu. O povo de Deus, que no deserto andava, sabe bem do que estou falando. Não foi uma única vez em que, rodeados pela imensidão do vazio, esse povo experimentou o cuidado de Deus, que fazia brotar dos lugares mais inesperados fontes que os saciavam e salvavam a vida ameaçada daqueles que eram levados como que em asas de águia pelo Senhor.
Afinal, como poderia Deus deixar sedentos aqueles que ama? Ele que amava Israel desde a mais tenra idade, e jamais deu voz para a sua ira (e olha que não foram poucos os motivos que Ele tinha para fazê-lo). O cuidado de Deus nos atrai de forma profunda, nos conecta a Ele com laços que ninguém poderá desfazer. Nos faz sentir que somos carregados no colo, alimentados, como uma criança que encontra o regaço de uma mãe. Cuidado assim, é coisa de quem tem coração. E de quem tem coração bom! Coração que ama!
Não é à toa que a Igreja nutre uma especial devoção pelo coração de Deus, manifestado na humanidade do seu Filho Jesus. O coração de Jesus é a expressão máxima do cuidado de Deus para com cada um de nós. Quando andávamos perdidos e errantes, no imenso vazio do nosso pecado, esse coração nos viu, teve compaixão, e nos saciou com a mais fina flor do trigo, com o mel que sai da rocha.
Divino coração!
Bendito coração!
Não é à toa que os artistas resolveram representá-lo saltando do peito de Jesus. É um amor tão grande, um cuidado tão afetuoso, que não cabe dentro de si e pula para fora, afim de que todos possam encontrá-lo. É um amor tão ardente que se abrasa em chamas, que envolvem esse coração e o incendeiam sem o consumir (como a sarça de Moisés), lembrando até o que nos dizia o grande poeta: “O amor é fogo, que arde sem se ver….”. Mas um coração que salta do peito… já dizia uma criança que contemplava a imagem, deve doer… e dói. Amar dói profundamente, e só quem já experimentou o amor sabe o quanto esse sentimento pode ser agridoce. É por isso que esse coração encontra-se cercado de espinhos. É por isso que esse coração se encontra rasgado. Pois foi no ápice da dor, que Ele demonstrou ao mundo todo seu carinho, todo seu amor, a riqueza insondável da graça de uma largura, comprimento, altura e profundidade tão grandes que não cabem no conhecimento humano.
Foi no meio do deserto mais profundo, na hora mais escura, que encontramos finalmente as raízes do amor. E mais uma vez, no meio do que parecia a morte para todos, uma fonte jorrou. Do coração aberto no alto da cruz, mais uma vez água jorrou para matar a sede daqueles que Deus cuida com amor infinito. A rocha ferida, deu e dá de beber a todos que se aproximam dela. Essa água que mana do seu lado sacia, corre ligeira e permite-nos até mesmo nos banharmos para nos livrar da poeira do deserto e da sujeira que carregamos conosco. O cuidado de Deus continua manifesto. O cuidado de Deus continua a se expressar nos momentos que menos imaginamos…
É um grande consolo para nós acreditarmos em um Deus que tem coração. Que triste seria se Deus fosse frio e impassível, distante de nós que somos seres tão passionais. Mas como comove-se grandemente conosco, e remói-se no seu amor, nosso Deus não se cansa de se rebaixar para cuidar daqueles que têm como crianças que gerou. Ele deixa seu coração pertinho da gente. Deixa o nosso coração bater na mesma frequência do que no dele. Basta que nós queiramos nos aproximar. Basta que tenhamos a ousadia de fazer como o discípulo amado e reclinar nossa cabeça sobre esta fonte que jorra para nos saciar.
Corramos! Bebamos com alegria desse manancial da salvação. Assim como a corsa anseia pelas águas, assim como a terra seca do sertão deseja pela chuva, desejemos também nós esse rio eterno que brota do trono da cruz e do cordeiro imolado. Se lá no princípio um rio corria pelo jardim do éden e dava vida a tudo, e o profeta viu que a água que manava do templo revigorava tudo que tocava, agora é a nossa vez de mesmo no deserto das agruras e dificuldades do dia-a-dia, nos alegrar, pois o coração de nosso Deus há de nos saciar. No coração de nosso Deus encontramos nossas fontes!
“O que torna belo o deserto,
é que ele esconde um poço nalgum lugar…”
(Antoine de Saint-Exupéry)
Gabriel Vitor Alves Silva – 2º ano de Teologia
Seminarista da Arquidiocese de Belo Horizonte