Dia de Todos os Santos e dia de finados
Santos e finados fazem parte do quadro de referências que compõem
uma cosmovisão que procura integrar os diversos aspectos da realidade e da
vida humana, numa tentativa de harmonizar todas as coisas num universo que tenha sentido. É o que todas as religiões procuram fazer: buscar o sentido último de todas as coisas.
Independente do mérito objetivo destas duas celebrações, elas fazem
parte da visão de conjunto que a fé cristã apresenta, e que é explicitada ao
longo de cada ano pelas celebrações tradicionais que compõem o calendário
litúrgico da Igreja.
A questão de fundo, em ambas, é a esperança na vida além da morte, interrogação que acompanha fatalmente nossa condição humana de seres mortais, mas capazes de se perguntar pelo sentido
de sua existência.
A este respeito, todos têm o direito de expressar suas convicções, e de formular também suas projeções além dos limites de nossa compreensão humana. Mesmo sem lançar mão dos dados oferecidos pela fé, é legítimo o esforço de encontrar suporte racional para a esperança de uma sobrevida. Pois na verdade, o fato de sermos capazes de interrogar a eternidade, já é sinal de que somos feitos para ela.
Mas é interessante observar que a fé cristã não se baseia em garantias
racionais para cultivar sua esperança na vida eterna. Ela parte de outro princípio. Ela funda sua esperança na maneira como Deus se revelou. Assim, a vida eterna é uma dedução, uma derivação de como Deus manifestou o mistério de sua própria existência.
Para os cristãos, a vida eterna não é entendida como consequência de uma
suposta imortalidade de nossa alma. Isto pode servir de suporte. Mas não mora aí a razão de nossa esperança, como São Pedro nos aconselha a buscar sempre. Nossa fé na ressurreição é muito mais consistente do que um simples raciocínio filosófico.
Se já o Antigo Testamento oferecia base sólida para a fé na ressurreição,
muito mais o Novo Testamento, que se constrói todo ele em torno da fé na
Ressurreição de Jesus. Depois de citar os fatos que servem de fundamento para o Evangelho, escrevendo aos coríntios, São Paulo tira a conclusão certeira e definitiva: “Ora, se prega que Cristo ressuscitou dos mortos, como podem alguns dizer que não há ressurreição dos mortos?”
A fé na ressurreição de Cristo, e em consequência, da nossa ressurreição, é o
núcleo aglutinador que harmoniza todo o conjunto da vida humana, com suas certezas presentes, e com sua esperança no futuro
Dom Luiz Demétrio Valentine
Bispo Emérito de Jales (SP)